domingo, 2 de novembro de 2014

Seu emprego é melhor que o meu?

Seu emprego é melhor que o meu?
Uma crônica de Gabriella Gilmore

Personagens:
Vanessa, brasileira, residente nos USA, secretária em um pequeno centro odontológico em Washington – DC

Camila, nordestina, residente em Brasília, recepcionista em um hotel 5 estrelas.

Conversa pelo Skype, 21:30 da segunda-feira do dia 29 de abril de 2013

- Amiga, queria te perguntar uma coisa. Escreveu Vanessa.
- Desembucha.
- Você me perguntou esses dias para te arrumar emprego aqui nos States e tals... não sei quanto você ganha ou se passa dificuldade ai, mas me conta. Você trabalha em hotel por quê? Uma amiga minha mora em SP e disse que tem um excelente emprego graças ao inglês. Não te entendo.
- Bom, na verdade essa coisa de ter inglês é de certa forma ilusória. Em Brasília, por exemplo, há três limitados campos de trabalho: Rede hoteleira, shopping centers (ou lojas no centro) ou passar em concursos. Há empresas aqui, mas são bem poucas e nem te preciso falar da concorrência.
- Mas não sei quem me disse, que estaria ganhando uns R$ 3.000 reais em shoppings se tivesse o inglês que você tem...
- Me apresenta essa pessoa. (Zombou Camila). Papo furado Vanessa. Não conheço ninguém que trabalha em lojas que precisou de inglês para conseguir emprego ou subir de cargo. Claro que há exceções, mas não é simples assim não. Agora é minha vez de levantar uma coisa.
- Pode falar.
- Sei que somos amigas há anos, e que você parece se preocupar comigo. Mas você está tão americanizada, fria e mecânica, que quando você toca em assuntos sobre empregos e salários, você passa a impressão de que só porque mora fora do país está abalando o bambu. Quer ouvir uma real?
- Fale.
- O que te faz melhor do que eu? Você saiu do Brasil para estar secretária em um país que nem é seu. O seu emprego nem é lá glamoroso. Já eu, sai do interior do meu país para ir para um grande centro trabalhar para ricos nojentos que se hospedam só em 5 estrelas, e aproveito para estudar outro idioma para futuramente ganhar melhor. Eu vejo o meu caso como progresso, e o seu?  Me fale depois. Outro exemplo tirando nós duas do caso. Tenho colegas de quarto que são concursadas e me olham com desdém feito você, às vezes. Uma delas é auxiliar de dentista. Limpa sujeiras dos utensílios dentários de pessoas de baixa renda (ela trabalha para o SUS). Precisa ser um CDF para trabalhar em um lugar desses? É outra coisa no Brasil que me revolta. Ralar para passar num concurso para fazer trabalho “sujo”. Eu, francamente, ainda prefiro meu trabalho explorador de domingo a domingo, onde fico em meio de artistas, gente bonita, rica e de bons contatos, nunca se sabe... Você entende o que quero dizer?
- ...
- Agora me diga você: Por que seu emprego é melhor do que o meu?


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