segunda-feira, 27 de julho de 2015

O Segredo de Um Homem



Quando caminhava pelas ruas de manhã para comprar pão e jornal, ele era um homem como qualquer outro. Era um homem de meia idade, bem conservado, realizado no casamento, pai de bons filhos, avô. Um homem honesto, cumpridor de seus deveres civis. Um homem de prestígio. Ninguém ousaria duvidar de seu caráter ímpar.

Toda manhã orgulhosamente cumprimentava educadamente seus vizinhos na volta para casa. Beijava respeitosamente a esposa e sentava-se à varanda para se pôr a par das novidades do jornal. Franzia a testa indignado de vez em quando. Comentava com esposa uma coisa ou outra. E, por cima dos óculos, espiava as crianças brincando nas calçadas. Era um homem feliz. 

O problema começava quando ele ficava sozinho. Quando sua esposa estava entretida com os afazeres domésticos. Quando ninguém o observava. 

Diante da solidão, a cabeça doente do nosso herói fervilhava de histórias, de delírios. Ora acreditava ser o dono do mundo ora era um cão humilhado. Sua cabeça era doente. Um débil. Coitado!

Certa vez achou que era galã de novela. Queria a todo custo seduzir todas as moças das redondezas enviando-lhe versinhos que ele escrevia com poses de Neruda. Gostava das moças, quanto mais jovem melhor, pois eram mais inocentes e a sua lábia as convenciam melhor. Já as maduras nem era bonitas nem eram burras e sabendo disso fugia delas. 

Empertigado, gostava de falar difícil, achava que isso mostrava elegância; e assim convenceria a todos de seu poder. E quando alguma ninfeta lhe lembrava da calva... Ah, amigo, dava-se o dilema! Ele partia para cima da moça como toda fúria gritando: "Tenho dinheiro. Posso comprá-la!". Sentia-se o próprio califa comprando mulheres para seu harém. 

Sentado em seu quarto solitário, a sua metade louca e doente maquinava ideias para atormentar os outros. Não era realmente feliz, logo queria ver infeliz o resto do mundo. Tinha inveja de quem conseguia viver para si e por si. Revoltava-se ao descobrir que não era o dono do mundo como supunha. Que na verdade, por mais que se esforçava, não era nada além de um velho solitário. 

Adoecido, nosso herói estava morrendo. Cada dia mais sozinho e confuso. Cada dia mais enterrado em suas crenças insanas. Um dia acordou para comprar o pão e o jornal e não achou ninguém. Procurou do lado de fora da casa as crianças brincando e tudo estava deserto. Chorou feito menino querendo colo, atenção, carinho... Perdeu-se na própria loucura o pobrezinho.
(Waleska Zibetti, in "O Segredo de Um Homem")