sexta-feira, 10 de julho de 2015

Amanhecer em Marrocos




"... A Cada instante de nossas vidas 

temos um pé no conto de fadas 
e o outro no abismo"
(Paulo Coelho)

Mais uma vez visitante de mim no dia que já quase amanhecia notei, há alguns quarteirões de certo passado, um sonho esquecido. Ao ver-me passear por ali, apesar de fraco e empoeirado me acenou. Aproximei-me mais para poder sonhar melhor e o sonho-menino abriu-me um sorriso de covinhas. Estava sentindo-se revigorado. Levantou-se do canto, estendeu suas mãos para mim e convidou-me a passear pelas ruas de céu alaranjado. 

Caminhamos lado a lado e eu pensava em como somos capazes de esquecer sonhos sem ao menos tentarmos traze-los a realidade. Ele estava tão orgulhoso de se sentir lembrado que apertava minha mão com suas mãos gordinhas e suspirava.  E me dei conta de que ele falava. 

Me contava sobre lugares mágicos e cores brilhantes combinadas sem frescuras. Falou-me de tardes com chá e de músicas inspiradas nos som das coisas. Relatou-me de construções românticas e paisagens místicas. Homens escondidos em véus e mulheres de olhares marcantes e de repente eu estava caminhando com meu sonho pelas ruas de Marrocos. 

O menino apressava-se entre as lojas escolhendo sedas e tapetes, cheirando e experimentando especiarias, barganhando jóias e artigos decorativos. E o céu já era azul e o mar movia suave suas águas aos nossos pés quando novamente me dei conta de que minha realidade é centenas de quilômetros dos homens sérios de Marrocos.

O menino estava vibrante porque eu me lembrara e me disponibilizara por ele. E me abraçou docemente agradecido por estar ali, apesar da hora, do tempo, da realidade, do risco... E sorrindo em covinhas correu para mar dizendo que voltaria para Marrocos. E que esperaria lá que num outro amanhecer eu o encontrasse nas ruas do mercado, vestida de sedas coloridas que relembrassem um céu de amanhecer alaranjado, cheirando a pimenta-rosa e falando de mistérios escondidos na fumaça de narguilé. Da areia acenei as gargalhadas para o sonho-menino vendo-o sumir no mar, enquanto um sol de amarelo-lúcido me abraçou convidando-me a mais um dia entre o sonho e a realidade.
(Waleska Zibetti, in "Amanhecer em Marrocos")