Era hora de dar um sentido à vida.
Hora de começar de novo.
(David Nicholls, in “Um
dia”)
Há
de aprender com a vida aquele que descobre que ela vai além dos limites que os
olhos alcançam. Há vida acontecendo nos micro-cantos do jardim nesse instante em
que meus pensamentos se esbarram uns nos outros no desespero de sair sem ficarem
esquecidos em mim.
O
livro da vida foi escrito em várias línguas e poucos homens conseguirão ler.
Não há faculdade no mundo capaz de fazer o homem mensurar a dimensão desse livro
de capa velha escrita em páginas a partir dos sonhos de uma energia boa que
convencionalmente eu chamo de Deus.
Há
de aprender a viver aqueles que se deixarem ampliar através de suas dores, de
seus amores, dos cheiros que o vento trás... Porque a vida está além do que as
mãos tocam. A vida está no olhar. E é ele que precisa alcançar a essência no
olhar do outro. É do encontro das duas essências que nasce o tal amor que as
pessoas procuram tanto em curvas e perfeições.
Para
viver é preciso espalhar-se pela vida como hibisco. Sempre que possível
pontuando-a com flores e perfumes. Para viver é preciso não ter medo de ser
tocado e é preciso correr o risco da lágrima ou do riso. Porque viver é
atravessar dias de felicidade e noites de angústia sem perder a fé no caminho.
Permitir
a si mesmo ser vinte e quatro horas fiel a si sem esquecer que ser fiel a
si, é pertencer-se sem ignorar o outro. Viver é olhar a diferença dos que nos
rodeiam sem julgamentos. É olhar os passos dos outros e entender as atitudes
através das pedras que seus pés tocaram no caminho. É entender que ainda
que não possa chamar todos de amigo e acolher, posso ao menos olhá-los com
humanidade e desejar que eles caminhem em paz.
A
universidade nos profissionaliza, mas é no ser humano que se aprende sobre a
vida. Um homem do campo entende mais da terra que eu sei tanto das letras, e
assim sendo ele me merece meu respeito no seu falar errado. A prostituta
entende da noite, o vigia entende do silêncio, o pescador entender do mar, a
freira entende mistérios, o doente entende do medo, o médico conhece da morte...
Há sempre alguém que entende melhor de algo da vida que nós não alcançamos. E o
fazem porque percorreram caminhos que desconhecemos.
Ninguém
pode percorrer todos os caminhos e beber de todos os vinhos da vida. O que
podemos é ouvir do outro e tentar entender. E entender nunca será o mesmo que
viver. Contudo, é o mais perto que podemos chegar da experiência do outro. E
quando a fome do outro nos deixa faminto, quando a solidão do outro nos invade,
quando a loucura do outro nos alucina... Quando de alguma maneira, por
instantes que sejam, nos esvaziamos de nós e de nossas certezas para sermos
preenchidos pelo outro; então, estaremos começando a viver.
Ampliar-se
ao invés de isolar-se, encaixar-se ao invés de adaptar-se, lapidar-se ao invés
de emoldurar-se... Ser o vento na ventania e o remo na calmaria. Ser o raio da
tempestade e o mormaço dos dias de calor. Ser a pétala da rosa na primavera e a
semente esperançosa no inverno. Ser João e ser Maria. Experimentar. Ousar. “Ser”
além de tudo. Crer, apesar de tudo. E amar acima de tudo. Isso é viver!