sexta-feira, 3 de julho de 2015

Na Estação



Ele estava lá como sempre esperando um trem, um trem que nunca passava, se passava não pegava.  Ele já era velho, sempre de pernas cruzadas, com roupas pretas, sempre lendo o jornal, sempre consultando seu relógio de bolso.

      Um dia chegou um trem e desse trem saiu um jovem, nessa hora o homem se endireitou. O garoto sentou no mesmo banco que o velho. Disfarçadamente o velho puxou conversa com o garoto. O garoto, que já não era tão moço, devia ter uns 29 ou 30 anos, mesmo assim o velho o chamou.

- Ei rapaz! – o garoto não percebeu que o velho o estava chamando, se percebeu não deu atenção.  O velho se calou.

Pouco tempo depois o garoto começou a olhar assustado para todos os lados. Não havia ninguém, não havia relógio e o pior não havia trem. Espantado o garoto se dirigiu ao velho.

- Ei senhor!  - o velho virou a cabeça calmamente. – O senhor teria horas, para me informar?

- Sim. – pegou seu relógio e olhou. – São 12h45min, por quê?
- Ah, estou preocupado.

- Preocupado? Com sua esposa?

- Não. Estou com medo de ficar atrasado.

- Atrasado? Para que?

- Meu trabalho. - O velho ficou pensativo.

- Então tá indo trabalhar, né? De quê?

- Sou empresário. Não posso me atrasar.

- A única pessoa que não pode se atrasar é a morte.

- Como?

- Por que tanta presa se a vida é bela e o tempo é curto?

- Ora, preciso ganhar dinheiro.

- Somente isso?

- Sim.

- E o resto?

- Que resto?

- A amizade, o amor, a diversão, a felicidade.

- Não preciso, sou feliz com o que tenho.

- Quando você ficar velho e o dinheiro ser uma coisa que já está sem utilidade, pois já tem tudo, o que você vai fazer?

- Vou descansar. – O garoto parecia orgulhoso.

- Sozinho? Meu filho, já faz três semanas que eu estou esperando por você aqui. Vim para te dizer que você não vai poder ficar sozinho tanto tempo. Saia um pouco mais, brinque um pouco mais, ame um pouco mais, viva mais.

- Mas eu vivo. E vivo bem com meu dinheiro e minha casa.

- Mas não tem ninguém para compartilhar, não tem um amigo para chamar, não tem uma vida que possa se orgulhar. O mundo é uma grande torre de relógio. Cada pessoa funciona como uma engrenagem, todas tem que estar ligadas para que o mundo funcione direito.

- Não preciso de ninguém. Sou bom do jeito que sou.

- Você precisa se desprender do seu trabalho. Escute a floresta, veja o mar, cante para o pôr do sol, saia com os amigos, viva para sua namorada. – Uma moça nova entrou na estação. Usando roupas vermelhas se sentou em um banco separado. O silencio dominou a estação.  A menina toda hora lançava olhares meigos para o rapaz, que nem dava atenção. O velho perdeu a paciência e cutucou o rapaz.

-Anda. Você precisa, um dia quando for velho só terá seus netos.

-Como eu...

- Seja você mesmo.  – O rapaz se aproximou e conversaram.  As horas se passaram e o garoto perdeu o seu trem, queria continuar aquela conversa. No alto do final da tarde, um beijo saiu. O velho olhou para eles e depois para a colina de onde o trem vinha. Seu trem chegava à estação.

Quando o trem chegou ele foi até ele, era um trem com somente um vagão.  O trem saiu da estação e o velho se pendurou no ferro para dar “adeus”.
- Adeus Mario, Adeus Joana. – O garoto e a moça se assustaram como ele sabia o nome deles?

- Espera se sabe quem nós somos. Quem é você?

- A única pessoa que não pode se atrasar. Eu sou a Morte.   – Sua mão ganhou virou um esqueleto assim como seu rosto, ele sacudia a mão em um profundo “adeus”.  – Au revoir, meu amigo, viva mais essa sua única vida. Não espere eu voltar para lamentar, faça.  O trem sumiu a fazer a primeira curva, dali em diante Mario aprendeu uma lição.

“...O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído...”
(João V. Zibetti, in “Na Estação”)