Ele estava lá como sempre esperando um trem, um trem que nunca passava, se passava não pegava. Ele já era velho, sempre de pernas cruzadas, com roupas pretas, sempre lendo o jornal, sempre consultando seu relógio de bolso.
Um dia chegou um
trem e desse trem saiu um jovem, nessa hora o homem se endireitou. O garoto
sentou no mesmo banco que o velho. Disfarçadamente o velho puxou conversa com o
garoto. O garoto, que já não era tão moço, devia ter uns 29 ou 30 anos, mesmo
assim o velho o chamou.
- Ei rapaz! – o garoto não percebeu que o velho o estava
chamando, se percebeu não deu atenção. O
velho se calou.
Pouco tempo depois o garoto começou a olhar assustado para
todos os lados. Não havia ninguém, não havia relógio e o pior não havia trem.
Espantado o garoto se dirigiu ao velho.
- Ei senhor! - o
velho virou a cabeça calmamente. – O senhor teria horas, para me informar?
- Sim. – pegou seu relógio e olhou. – São 12h45min, por quê?
- Ah, estou preocupado.
- Preocupado? Com sua esposa?
- Não. Estou com medo de ficar atrasado.
- Atrasado? Para que?
- Meu trabalho. - O velho ficou pensativo.
- Então tá indo trabalhar, né? De quê?
- Sou empresário. Não posso me atrasar.
- A única pessoa que não pode se atrasar é a morte.
- Como?
- Por que tanta presa se a vida é bela e o tempo é curto?
- Ora, preciso ganhar dinheiro.
- Somente isso?
- Sim.
- E o resto?
- Que resto?
- A amizade, o amor, a diversão, a felicidade.
- Não preciso, sou feliz com o que tenho.
- Quando você ficar velho e o dinheiro ser uma coisa que já
está sem utilidade, pois já tem tudo, o que você vai fazer?
- Vou descansar. – O garoto parecia orgulhoso.
- Sozinho? Meu filho, já faz três semanas que eu estou
esperando por você aqui. Vim para te dizer que você não vai poder ficar sozinho
tanto tempo. Saia um pouco mais, brinque um pouco mais, ame um pouco mais, viva
mais.
- Mas eu vivo. E vivo bem com meu dinheiro e minha casa.
- Mas não tem ninguém para compartilhar, não tem um amigo
para chamar, não tem uma vida que possa se orgulhar. O mundo é uma grande torre
de relógio. Cada pessoa funciona como uma engrenagem, todas tem que estar
ligadas para que o mundo funcione direito.
- Não preciso de ninguém. Sou bom do jeito que sou.
- Você precisa se desprender do seu trabalho. Escute a
floresta, veja o mar, cante para o pôr do sol, saia com os amigos, viva para
sua namorada. – Uma moça nova entrou na estação. Usando roupas vermelhas se
sentou em um banco separado. O silencio dominou a estação. A menina toda hora lançava olhares meigos
para o rapaz, que nem dava atenção. O velho perdeu a paciência e cutucou o
rapaz.
-Anda. Você precisa, um dia quando for velho só terá seus
netos.
-Como eu...
- Seja você mesmo. –
O rapaz se aproximou e conversaram. As
horas se passaram e o garoto perdeu o seu trem, queria continuar aquela
conversa. No alto do final da tarde, um beijo saiu. O velho olhou para eles e
depois para a colina de onde o trem vinha. Seu trem chegava à estação.
Quando o trem chegou ele foi até ele, era um trem com
somente um vagão. O trem saiu da estação
e o velho se pendurou no ferro para dar “adeus”.
- Adeus Mario, Adeus Joana. – O garoto e a moça se
assustaram como ele sabia o nome deles?
- Espera se sabe quem nós somos. Quem é você?
- A única pessoa que não pode se atrasar. Eu sou a
Morte. – Sua mão ganhou virou um
esqueleto assim como seu rosto, ele sacudia a mão em um profundo “adeus”. – Au revoir, meu amigo, viva mais essa sua
única vida. Não espere eu voltar para lamentar, faça. O trem sumiu a fazer a primeira curva, dali
em diante Mario aprendeu uma lição.
“...O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído...”
(João V. Zibetti, in “Na Estação”)