terça-feira, 28 de outubro de 2014

História de Uma Estrela Cadente

Sentou-se para pensar na vida no fim da tarde. Seus olhos perdidos num pedaço de céu cinza chumbo que anunciava temporal. E um vento frio, anunciava uma noite difícil. “Ele disse que viria as oito. Falta muito” – concluiu então, antes de mergulhar seus pensamentos no passado.

Ele era um homem bonito. Simples assim. Nunca foi lindo, mas era bonito. Isso ninguém podia negar. Ela era bonita também. Tinha dessas belezas diferentes que as pessoas não sabem explicar. Eu poderia jurar que o que ela tinha de fato era carisma. Uma luz de menina nos olhos que fazia com que ela se destacasse. Ele não tinha carisma nenhum. Era só bonito.

Ela tinha sonhos e os pendurava nas estrelas todas as noites pouco antes de dormir. De sua cama ela olhava seus sonhos brilhando lá no céu. Ela era tímida demais para falar deles com outro alguém que não fosse com ele. E ele a ouvia sempre com um sorriso, porque ele não tinha sonhos. Era dessas pessoas duras demais diante da vida e não sabia sonhar. Mas ele vivia, um a um, os sonhos dela e sonhando os sonhos dela, ele se sentia feliz.

A lua era o refúgio dos dois. E ela dizia que na lua morava um dragão que ela um dia iria montar e sair pelos céus apostando corrida com os cometas. E eles venceriam os cometas porque seu dragão era encantado. Ele dizia que São Jorge havia matado o dragão. Ela ficava brava e fazia pirraça porque ele havia destruído a fantasia dela e nessas noites ela chorava olhando a lua e de tristeza, a lua se escondia numa nuvem qualquer até que ela adormecesse entre soluços. Ele não fazia por mal e no dia seguinte ele aparecia com um desenho de dragão que voava feliz ao redor da lua. E ela sorria feliz com seu dragão.

Eles eram dois extremos, mas um dependia do outro para existir. Ela era poética, ele cético. Ela falava palavrão, ele era polido. Ela comia pizza com a mão, ele não sabia pisar no chão. Ela ria de tudo, ele questionava. Ela dançava na areia da praia, ele corria para o trabalho. Ela cantava no chuveiro, ele lia o jornal. Ela o amava, ele, eu já não sei dizer.

“Ele virá as oito” – ela disse arrumando-se na varanda. Ouvindo a voz marcante de Billie Holliday em uma canção que ela cantarolou baixinho. Logo, sentiu-se sendo levada para um tempo muito depois daquela noite em que eles se despediram.

A vida dela era outra. Não havia mais sonhos pendurados em estrelas durante suas noites. A maior parte do tempo era só ela e algumas coisas que ela guardava em uma caixinha de ilusões. A menina feliz, era agora uma mulher de realidade dura. Pouco tinha tempo para si. Mas não perdera seu sorriso. Algo nela ainda era esperança. E, em algumas noites, ela olhava a lua e imaginava o dragão voando atrás dos cometas. Mas sem ela a acompanhá-lo. Seus olhos marejavam. E ela disfarçava olhando a novela. E olhava tanto até que o sono a roubava dali.

Ela crescera. Ela virara mulher. Ela virara mãe. E que graça havia nela agora? Era só mais uma como as outras. Não lembrava mais de poemas, silenciou seus palavrões, aprendeu a usar o garfo e a faca, esqueceu como rir com facilidade, tem vergonha de dançar, seus banhos são corridos, desaprendeu a amar. Ele simplesmente vem às vezes. Como hoje!

E ela se inquieta. Em seu coração a dúvida doendo. “Será que ele virá? Como será que ele está?” – uma vontade de chorar contida dentro do peito. E ouve-se um trovão ao longe. Ela olha para o alto e o coração apertado. Ele está chegando. Um relâmpago. Ele está perto. Ela vai para o meio da rua. Ela chora olhando o céu. Ele desce enfim no meio da rua. Abaixando-se suavemente diante dela numa espécie de reverência. Ela acaricia seu rosto com carinho. “Meu dragão!” – ela exclama feliz. Ela o abraça e ele a leva em vôo livre. O povo na rua comenta a estrela cadente. Ela é menina de novo.

A morte pode roubar pessoas. Mas não pode vencer o amor. Enquanto viver a menina na mulher, ele viverá. E quando você vir no céu uma estrela cadente, fique feliz porque é o sinal de que tudo pode ser possível àqueles que não têm medo de acreditar.

(Waleska Zibetti)

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